domingo, 4 de janeiro de 2009

Tiro ao pato, tirem nossos maridos e filhos de lá


Desde a semana do natal que venho tentando sentar aqui na frente da minha tela para deixar uma mensagem de fim de ano para os amigos que me visitam, mas andei tão atrapalhada que acabei deixando passar as festas. Pensei que o primeiro domingo do ano seria o ideal para escrever uma bela mensagem de fé e esperança para o ano que se inicia. Só que hoje, ao sentar-me aqui, decidi que fé e esperança todos que são PPMM ou parentes dos mesmos temos esses de sobra, como diria minha vó: “para dar e vender”, senão, como estaríamos sobrevivendo até hoje? Como estaríamos conseguindo levantar todos os dias levando a vida com tanta força? Mas o que mais me afastou da “mensagem lugar comum” foram os acontecimentos dos três primeiros dias do ano. É meus amigos, o ano ainda nem começou (só vai começar mesmo depois do carnaval) e já tivemos dois ataques a policiais militares em dois dias, com o saldo de dois mortos e dois feridos, sendo um com gravidade. Um dos ataques demonstra com clareza a banalização da vida do PM, mostra a pouquíssima importância que se dá ao homem por trás da farda (apesar da rapidez com que se prendeu o criminoso). Um homem, aparentemente acima de qualquer suspeita, daqueles que se fosse atingido em meio a uma confusão por um “policial despreparado”, iria provocar comoção geral sem falar das ofensas do governador e dos esbravejamentos dos familiares, sacou uma pistola e, por causa de uma reles briga por vaga em estacionamento, matou a sangue frio dois PPMM e fugiu em seguida. Aposto que nenhum de vocês leu nenhuma manchete nos jornais falando do fato, ou assistiu nosso governador largar a taça de champanhe da comemoração da posse de seu pupilo para berrar a plenos pulmões que o sr. Técnico de Som Residente no Grajaú era um “Débil Mental”, ou pelo menos assistiu uma mísera declaração do governo declarando luto e indignação; Pior ainda, alguém viu um representante do governo vir à público desejar os pêsames aos familiares desses policiais que, no cumprimento do dever, se depararam com um “bicho” que não pensou duas vezes antes de tirar duas vidas? Apesar da ação da delegacia da região onde ocorreu o crime e da rapidez da P2 do 6º BPM em efetuar a prisão, alguém duvida do desfecho desse caso? Mas ninguém se importou! A mídia, sempre tão solícita ao atirar pedras e buscar manchas nas condutas dos policiais que se envolvem em ocorrências de morte de inocentes normalmente em momentos de grande tensão, deve ter dedicado umas linhas em algum rodapé de página só para não dizerem que não foi noticiado, não sei das manchetes de hoje, ainda não li os jornais, mas ontem o destaque era para a morte do empresário alemão de férias em Paraty, é isso aí, afinal policial não é gente, é patrimônio do estado e quando danificado abre-se outro concurso e admite-se mais dois mil “débeis mentais” para substituição, parece aqui em casa quando queima uma lâmpada e eu grito: “Rico, tô sem luz no banheiro, troca pra mim”, nem o nome do objeto que vai ser trocado eu pronuncio, e é assim que o governo nos trata. O outro caso é tragédia anunciada, daquelas que só quem não sabia que iria acontecer é a criatura que criou a tal “visibilidade”, ótima para o povão que passa e vê a viatura ali, paradinha, IMÓVEL (cheguei a achar que o nome MOVE seria uma alusão à posição), mas péssima para o policial que fica vulnerável em uma posição de alvo pra quem quiser. Nunca entendi esse tipo de “policiamento” onde se expõe a vida do homem e onde não se dá o mínimo de dignidade, fica parecendo que, por ser policial, o cara é máquina que não sente calor, frio, nem necessidades fisiológicas. A criatura que os põe ali deve ter um botãozinho de “liga/desliga” que controla essas necessidades ou então não tem rins, bexiga e intestinos e, por isso, não conhece a importância de se ter, pelo menos, um banheiro. Também, banheiro pra quê? No calor de quarenta graus com sensação térmica de 45° que deve fazer na perimetral e nesses elevados da vida sem água e com a comida chegando já passada, sem contar com a quantidade de gás carbônico inaladas, as únicas coisas que o indivíduo não deve produzir são urina e fezes, mas isso não vem ao caso agora, o que está em pauta é a “visibilidade” ou “barraquinha de tiro ao pato”, com a colocação de toldos azuis em alguns pontos, aí mesmo é que ficou parecendo uma barraquinha. Dois policiais foram atingidos em uma dessas visibilidades, um está em estado crítico e o outro sem gravidade, mas como disse antes, tragédia anunciada. Agora só nos resta perguntar: E aí Governador? E aí Secretário de Segurança? E aí senhor Comandante Geral? Até quando veremos nossos maridos, pais, filhos, irmãos, etc, sendo mortos em operações sem sentido que só expõem a vida do PM e que nenhum resultado concreto traz para a população? Até quando teremos que ouvir nossos bravos sendo chamados de “débeis mentais”, inconseqüentes, despreparados e outros adjetivos sem que os senhores comecem a dar para só depois cobrar?
Querem saber, era para ser uma mensagem de fé e esperança, mas acabou virando um desabafo, um relato da revolta e da mágoa que hoje povoa o coração dos parentes e daqueles que amam e honram a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro, mas no fim é também uma mensagem de fé, fé que um dia alguém olhará e sentirá no fundo do coração que o Policial Militar não pode ser olhado nem de cima, nem de lado, mas deve ser olhado de frente, olho no olho, que ele deve ser encarado como o homem e mulher que está ali no dia-a-dia, servindo e protegendo, porque sempre que precisamos de ajuda, o primeiro número que lembramos não é o da mãe nem o do marido mas o 190 e, esses homens estão por aí, morrendo feito insetos e a grande maioria da sociedade pouco se importa, aliás tem até gente que diz que é menos um, e eu tenho que concordar que é menos um: menos um pai, menos um marido, menso um irmão, menos um filho, e por aí vai...
Aos bravos que se foram no raiar de mais um ano, que Deus os receba de braços abertos, às famílias só posso deixar um abraço forte com muitas lágrimas por mais esses sóis que nasceram no céu do Brasil me desculpando pelo egoísmo de agradecer a Deus por meu marido não ter sido uma das vítimas, me despeço sem os tradicionais votos de Feliz Ano Novo!

5 comentários:

Anônimo disse...

Obrigado por vc ser a porta-voz de todos nós (cerca de 40 mil). E que o nosso Deus Todo Poderoso continue nos guardando.

Nobre disse...

Sou PM em MG e gostaria de externar meus sentimentos a todos os familiares de amigos dos Policiais do RJ que partiram em durante a incompreendiada e nobre missão de ser PM.

Anônimo disse...

Sra. Silvia:

Realmente fico alarmada toda vez que venho ao Rio e vejo o tal do "MOVE".
Olho para os homens que ali estão e fico imaginando que para eles deve ter o sentido de "Espera da Morte"!
Sei o que é isto.
Sei bem o que estes Policiais sentem e como ao final da jornada estão destruídos psicologicamente.
Creio que alguns não gostarão desta minha opinião, afinal, passar para o público que o Policial Militar é um ser humano como outro qualquer, parece para uns: uma afronta a Dignidade do Militar.
Mas é isso que acho: o fato de haverem escolhido a Profissão e terem cursado o CFAP, não dá o direito à ninguém de colocá-los em "Risco Iminente".
São Policiais Militares e não fizeram opção por serem suicidas, como Kamikases, Homem Bomba, etc.

Às famílias enlutadas, meu fraterno abraço!

CHRISTINA ANTUNES FREITAS

Esposa de Praça da PMERJ disse...

Sra. Cristina

Agradeço sua visita e o comentário, é exatamente esse o sentimento de todas nós, mulheres e mães!

Esposa cansada de não fazer nada disse...

Oi Silvia, vc. está certa sobre a forma de comemoração dos 200 anos da PM. O governador hipócrita recebe uma medalha e a sociedade vendida e hipócrita ganha festa; festa essa em que aqueles que deveriam "comemorar", pois nada tem para comemorar, trabalham fazendo a segurança daqueles que só sabem reclamar. Nós esposas deveríamos tentar e conseguir juntas tomar as redeas da situação, se nossos maridos não podem ir as ruas, nós podemos mas, como já relatei a vc. esta é uma situação complicada, delicada, pois conheço esposas que por mais que reclamem, aceitaram, como seus maridos a situação como está, pois acham que nada pode ser feito para mudar então, fica difícil dar o primeiro passo. Poderíamos marcar de nos encontrarmos em algum lugar, conversarmos, trazermos mais pessoas que queiram dar um basta nesta HIPOCRISIA que vivemos e irmos as ruas lutar por nossos direitos, como já ocorreu em outros estados. Vamos procurar uma forma de nos unirmos e lutarmos.